quinta-feira, maio 01, 2014

Costumavas dizer-me tanto... E agora não dizes nada.


Costumavas dizer-me tanto... E agora não dizes nada.

Penso que a parte mais difícil de ver-te ir embora, foi ter de me habituar a este silêncio. Outrora, fomos música. Fomos palavras. Fomos risos a plenos pulmões. Agora, não passamos disto mesmo... Sentimentos calados e cobertos pelo vento ensurdecedor. Olhares mudos e vazios que nada transmitem. Mãos que deixaram de se conseguir agarrar. Não passamos disto. E éramos tanto, mas tanto... Como é que é possível um tudo virar nada, sem que se possa impedi-lo?

Como é que se aceita o fim de algo que se tornou parte de nós? Como é que se aceita o fim de algo que foi o nosso começo? Como é que se aceita o fim de uma vida a dois, quando já nem nos lembramos de como é viver um sem o outro? Como é que se abre a porta a um fim, que só nos aparece para levar tudo o que temos consigo?

Costumavas dizer-me que os meus olhos eram lindos de morrer... Será por isso que, agora, os evitas por completo? Com medo que, a cada breve cruzar dos nossos olhares, morras mais um bocadinho por dentro? Com medo que, ao olhares para mim de frente, consigas ver o teu reflexo nestes meus olhos, que já nem te conhecem? Com medo que, esse tal teu reflexo, até a ti te seja estranho? É disso que tens medo? Sempre tiveste tantos medos, apesar de sempre me teres dito que nada te assustava. Quem sabe? Talvez foi em mim que encontraste aquilo que tu mais temias no mundo: uma tempestade bruta incapaz de se prever. Foi isso que te fez ir embora? Será que é por isso que não tens medo de nada? Por simplesmente fugires de tudo aquilo que te faz tremer? Tudo aquilo que não consegues compreender?



Dedicámos tantas músicas um ao outro. E tantos filmes. E tantos livros. E tantas foram as histórias que trocámos, incansavelmente, só para nos aproximarmos ainda mais um do outro. Costumavas dizer-me que não era o meu Passado que te interessava, porque tu não existias nele. E, no entanto, adoravas ouvir as minhas histórias de infância e as minhas peripécias de adolescente. Ríamos a plenos pulmões e perdíamos a noção das horas... Nunca pensei que, tão cedo, virias a tornar-te apenas numa história de Passado que recordo com mágoa. Nunca pensei que, tão cedo, te fosses perder do meu Presente. E que Futuro é este que me deixaste, sem ti?

Costumavas dizer-me tanto... E, no entanto, não me dizias o suficiente. E eu queixava-me, que parva. São os dias de hoje, em que não recebo nada mais vindo de ti senão silêncio, que me apercebo do quão importantes eram as tuas palavras. Sinto tanto a falta delas. Relembro-as a todas e vou usando-as para me distrair deste eco vazio que me cerca, dia após dia. Tenho saudades do som da tua voz. Tenho saudades da forma como soletravas tão bem cada sílaba. E mais que isso: sinto a falta toda de ti. De tudo em ti. Mas, agora, nem te vejo, nem te ouço... e pudesse eu sequer tocar-te.

Abraçaste-me num dia de chuva e disseste-me que tudo iria ficar bem. Que tínhamos tempo. Que tínhamos planos. Que tínhamos sonhos. Que tínhamos estrada a percorrer. Mas o tempo esgotou-se, porque levaste-o com ele. Os planos foram furados com a tua decisão de partir. E os sonhos desvaneceram-se ao som dos teus passos pela estrada que te levou de mim. Está a chover, neste momento, e onde estão os teus braços para me abraçarem? E onde estás tu para me dizeres que tudo vai ficar bem? Diz-me onde estás, por favor.


No nosso último dia, nem te reconheci. Fiquei a mirar-te por um bocado, à tua procura, no olhar, mas tu não estavas lá. Agarrei a tua mão e tu afastaste-a, como se um mero toque meu te queimasse. Nem me olhavas nos olhos, com medo, quiçá, de te perderes neles como costumavas. Mas tu não eras (mais) tu. E era eu a atirar-te com motivos para ficares comigo, e tu a dares-me motivos para partires. No final, disse-te “adeus”, como quem quer dizer “por favor, fica”. E tu disseste-me “adeus”, como quem diz “não há volta a dar”. 

Costumavas dizer-me tanto... Mas agora não dizes nada. Silêncio, foi a única coisa que me deixaste. A única coisa que restou. Depois de tantas músicas, de tantos filmes, de tantas histórias. E o meu coração, tão calado, quase que explode por ter tanto a dizer. Mas tu já não estás cá para ouvi-lo. E queres saber uma coisa? Esse ainda chama por ti. Pelo teu nome; por mais nenhum.

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