sábado, maio 07, 2016

"DAYS I HAD WITH YOU"


Era um daqueles dias tão nossos, que outrora costumávamos partilhar, quando ainda nos restavam dias de sobra. (Ou pelo menos escolhêramos acreditar nisso). Chamo-lhes de “nossos”, porque éramos egoístas ao ponto de termos dias intocáveis do resto do mundo. Resguardávamo-nos na tua enorme casa de campo um fim-de-semana inteiro, se fosse preciso. Sem atender chamadas de quem quer que fosse, porque lá está: naquele mundo, só existia eu e só existias tu.

No teu terraço, ao cair da noite, partilhávamos cigarros e pensamentos, perdidos das horas - nem essas deixávamos que chegassem a nós. E, a medo, perguntei-te, enquanto mirava a tua face meramente iluminada pela luz soturna da lua:

- Será possível morrer por se amar tanto?

Tu acenaste com a cabeça levemente, como quem discorda. Não fosses tu sempre do contra.

- O amor não se quantifica. - murmuraste, sem nunca afastares o olhar das estrelas - E o amor é a única coisa capaz de nos salvar.

Assenti, como quem concorda. Não fosse eu tomar todas as tuas palavras como dogmas inquestionáveis. Permaneci albergada nos teus braços, como se de um porto de abrigo se tratassem. Até que me lembrei das tempestades que, de vez em quando, rebentavam com a costa, destruindo tudo por onde passavam.


- Às vezes, sinto que te amo a um ponto que chega a doer. Sei que é tolice minha, mas só de pensar que poderei perder-te, sinto-me a (des)falecer. - confessei, encostando-me à tua nuca, como se quisesse esconder-me de ti.

- Talvez morras de amor por mim. - disseste, como se não fosse nada.

E eu deveria ter-te dito. Que o amor pode, sim, ser aquilo que nos salva, mas só enquanto dura em ambos os nossos corações. Mas que também pode ser a nossa ruína, assim que alguém é deixado a amar sozinho. Não tive coragem de o dizer, porque, quiçá, sempre soube que, de nós os dois, eu seria sempre a que te amaria até ao fim. Até depois do fim.

Não se morre por se amar tanto, é verdade. Mas também não se vive. É um outro qualquer limbo, este em que me deixaste, assim que partiste e levaste contigo aqueles dias que nos restavam. E ainda hoje, passado tanto tempo, existem alturas em que sinto umas saudades tuas tão atrozes, que até me chega a doer o corpo todo. Quiçá, nem possa chamar-lhe dor. É algo transcendente, que me corrói a alma e me faz deixar de acreditar no amor e em tudo o que dele faz parte.


Até que penso na tua voz a sussurrar ao meu ouvido. Ou no teu espreguiçar contra o meu corpo, naquelas manhãs de Verão. Ou nos teus dedos cruzados com os meus, enquanto percorríamos as avenidas da cidade, sem destino. E, aí, apercebo-me que, por mais finito que seja, o amor que outrora partilhámos, naqueles dias tão nossos, foi a coisa mais real que poderia ter existido.

O amor não se quantifica, é verdade. Sempre tiveste razão em muitas coisas. No entanto, em contrapartida, deixaste-me a acreditar que eu sempre te havia amado mais do que tu a mim. Não é relevante, na verdade, mas ainda hoje isso me dói. Como foi tão fácil para ti deixares-me a amar sozinha, e a morrer de amores por ti, como se não fosse nada. Como se, naqueles dias tão nossos, eu teria sido a única que os sentia realmente. Como se o amor deixasse sempre um condenado, e o outro quase imaculado.

Acabei por ser condenada por todo o amor que senti por ti. E o que é que hei-de eu pensar do amor, agora, neste momento? Acabei condenada como se tivesse cometido o maior crime, quando o grande ladrão foste tu, que levaste o meu coração contigo e nunca mais voltaste.

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